Em Inglaterra, o Arsenal. O Milan em Itália. O Bayern na Alemanha. O PSG por França. O Real Madrid aqui ao lado, em Espanha, mas também o Valência de Peter Lim, depois de ter levado no saco André Gomes, João Cancelo e Rodrigo. As notícias sucedem-se, um pouco por todo o lado. As pesquisas no Google também, com o motor de busca a devolver páginas e páginas sem fim. Gonçalo Guedes é dos nomes mais falados no mercado, a mês e meio, mais coisa menos coisa, da sua abertura. 65 minutos na Covilhã, dos 25 aos 90 e picos, bastaram para chamar para si as atenções dos gigantes do continente e recolher heranças pesadas, também por questões de timing. Mas já lá vamos.
No próximo sábado, o Benfica receberá o Moreirense para a Taça de Portugal e, a meio da semana seguinte, terá a visita à Rússia para defrontar o Zenit S. Petersburgo, em partida decisiva da Liga dos Campeões. Jorge Jesus, como fez na Covilhã, terá de pensar novamente na gestão de esforços e o nome do jovem poderá vir à baila nas contas e acabar mesmo por somar minutos. O treinador já disse e repetiu que, para ele, «Gonçalo está dois anos à frente da idade». E elogiar jovens não é assim tão comum no Jota-Jota.
O salto para a fama
O novo Cristiano Ronaldo. É assim que lhe chamam do lado de lá do Canal da Mancha, sobretudo em Londres, onde Arsène Wenger ainda hoje se arrepende de não ter pago em 2003 os 15 milhões pedidos pelo Sporting pelo original – o Fenómeno brasileiro não entra neste filme –, perdido para o Manchester United, e agora, a caminho dos 30 anos, jefe do Real Madrid e já considerado um dos melhores de sempre. Na Alemanha, porque o francês Franck Ribéry já leva 31, é nesse legado que pensam para o miúdo nascido em Benavente. Ou seja, em terras germânicas e gaulesas, também já é o novo Ribéry.
«Não gosto de comparações. O que posso dizer é que se tivesse continuado no Benfica, o Gonçalo e o Renato Sanches seriam jogadores em que iria apostar no ano passado. O Gonçalo é um jogador muitíssimo bom, tem um potencial enorme. Dribla bem, faz receções de forma orientada. Tem força, velocidade, remate, com o pé esquerdo, com o pé direito, de cabeça... Não tem medo de assumir o risco e o um-para-um. Revela uma maturidade, que já na altura era visível», contou à MFTOTAL o treinador Luís Norton de Matos, que recebeu o jovem nos primeiros treinos no Benfica B e orientou em alguns jogos, à porta fechada, no Seixal.
O técnico acredita que a afirmação surgirá a curto prazo: «Dentro de algum tempo, pouco tempo, irá afirmar-se. Tanto o Gonçalo como o Renato Sanches, de quem se fala menos, são dos melhores do mundo na sua idade nas posições que ocupam. Quando se tem qualidade e personalidade, isso acaba por acontecer. Se está dois anos à frente da sua idade? Não sei se dois ou três, para mim a questão da idade não é relevante. Basta ver a idade de alguns jogadores titulares em equipas da Premier League. O Shaw, o Januzaj... Se há qualidade e personalidade, quanto melhor o contexto e o ambiente que os rodeiam melhores se tornam. O Gonçalo tem tudo para se impor no Benfica e estar no top mundial. Tive a oportunidade de treinar dois jogadores de top, como o André Gomes e o João Cancelo. Quando o João se tiver disciplinado no jogo e ganhado experiência será acima da média, e o André está a provar grande qualidade numa equipa como o Valência. Mas em potencial... Vejo grandes jogadores a serem formados no Benfica, mas estes dois são para mim dos melhores nas respetivas posições.»
Não há quem não diga que é muito cedo, porque o é. Contudo, a verdade é que o título deste artigo é redutor. Não foram só 65 minutos de peito feito, assim que Ola John disse que não podia mais, há toda uma campanha cheia de coisas boas na Youth League, que o colocaram no onze ideal da competição, até à final perdida com o Barcelona, um golo de pontapé de bicicleta que correu mundo na competição de juniores da UEFA, o crescimento desta época na equipa B e a simbologia de se ter sentado no banco na Liga dos Campeões, no Mónaco. Um ano antes, na mesma competição, já tinha sido inscrito por Jorge Jesus com 16 anos. O Benfica parece ter bem noção do diamante que tem em mãos, protegendo-o de forma semelhante ao que fez com Nélson Oliveira desde tenra idade até à sua estreia na equipa principal.
«É positivo sempre que um clube aproveita um jogador da sua formação em que vê qualidade. Nélson Oliveira, numa competição mundial, foi considerado dos melhores. Havendo ordem natural na progressão da carreira esse valor demonstrado teria seguimento. Mas o enquadramento também é importante. Ou se abre um espaço para que prove o seu valor no imediato ou então corre-se o risco de estagnação. O Nélson foi emprestado, mudou de contexto e não conseguiu o rendimento que se esperava dele. O Gonçalo é mais completo, tem mais qualidade. O Nélson é mais ponta de lança, mais jogador de área, já o Gonçalo é mais completo em mais zonas do campo. Remata bem com os dois pés, tem golo, é bom no último passe, marca e dá a marcar. E tem um enquadramento mais favorável para se afirmar no Benfica do que na altura tinha o Nélson. Há uma forte aposta nele, com toda a justiça, tal como o FC Porto fez com Rúben Neves», explicou Norton de Matos.
O golo de pontapé de bicicleta ao PSG:
Falta, obviamente, um oceano inteiro a ultrapassar chamado continuidade e isso é algo que merece ser sublinhado. Mas o que mais impressiona no miúdo de 17 anos, praticamente 18, é a forma como aceita naturalmente os desafios. Como esquece quem está à frente e parte para cima, não tendo medo de perder a bola e sentir o peso dos acenares de desacordo nas suas costas. Vertical. Objetivo. Remata forte e bem, e apresenta uma técnica sobre a qual construir e melhorar ainda mais o seu jogo. Com trabalho. Nisso, é, com as devidas distâncias, muito semelhante ao 7 do Real Madrid.
50 milhões de blindagem
Os 65 minutos e mais o que se acrescentou depois – somados também à vontade de Luís Filipe Vieira em aproveitar a formação para a equipa principal, presente em várias das suas promessas desde o primeiro mandato, incluindo a célebre «espinha dorsal da Seleção» – garantiram-lhe contrato até 2019, com cláusula de rescisão de 50 milhões de euros, de acordo com o que confidenciou o seu empresário em entrevista recente a um site italiano. Antes, o número era 45, e chegou a ser mais de 80, em algumas notícias provenientes de Inglaterra, ao mesmo tempo que se veiculava o piscar de olhos dos gunners.
Norton de Matos não encontra grandes imperfeições no projeto de jogador que teve à sua frente. «O Gonçalo vai poder melhorar pelo treino, e está num clube muito exigente. Vai precisar de manter forte a parte mental, e de jogar, sobretudo nas competições mais exigentes. A equipa B está a ser muito importante, porque é um patamar acima em relação à sua idade. Vai ganhar naturalmente tudo o resto, se mantiver esta mentalidade de querer ir sempre mais longe. É um rapaz forte, com bom enquadramento familiar, falta jogar mais.»
Por enquanto, Paulo Rodrigues aproveita a onda de entusiasmo com o seu pupilo, uma das poucas pérolas que não foi apanhada cedo pelo mega-empresário Jorge Mendes, e até chegou a deixar no ar que poderá chegar mais longe que Cristiano. «Fala-se muito nele, é verdade. Mas eu, o jogador e o clube pretendemos que ele continue a jogar no Benfica. O sonho dele é afirmar-se na Luz», atirou.
Ainda com pouco golo O Benfica já terá corrido alguns riscos com Gonçalo, que terá andado perto de assinar a custo zero com o Bayern Munique no final da época passada, numa altura de indecisão do clube sobre a aposta em si, em detrimento de outros. Os encarnados ainda terão ido, no entanto, a tempo de emendar a mão. Pouco depois, o avançado tinha deixado de vez o anonimato e já não eram só os alemães que vinham atrás.
Para já, os 318 minutos que leva a marcar um golo – três em 12 encontros na II Liga – é um registo naturalmente muito distante do melhor do mundo, mas há ainda a sublinhar as cinco assistências já conseguidas num escalão que é exigente para os jovens e que Gonçalo experimenta pela primeira vez de forma consistente. Está ainda na Seleção sub-19, depois de ter andado pelos sub-20, e ainda esta segunda-feira assinou mais um grande golo, de livre direto, na vitória sobre a Dinamarca por 2-1, que garantiu a Portugal o primeiro lugar na ronda de elite de acesso ao Europeu da categoria. Mas, se quisermos insistir na comparação, Cristiano Ronaldo já era um goleador no ano de estreia no Sporting? CR7 fez cinco golos em 33 jogos, 16 como titular, em todas competições. Tinha 18 anos no final dessa época.
A Taça de novo no caminho
Vem aí a Taça e Gonçalo Guedes volta a poder ser chamado por Jesus. Tem crescido, entre os treinos com a equipa principal, os jogos na Honra, aquelas dezenas de minutos intensos na Covilhã e o banco no Mónaco. Mais tempo de jogo significará novo degrau subido na longa escadaria, onde outros, como André Gomes e Bernardo Silva (e também Nélson Oliveira, de quem já falamos antes), não conseguiram a afirmação total. Na Luz, espera-se obviamente que cumpra as expetativas, cada vez maiores.
Um miúdo com vontade de aprender. É assim que Gonçalo se sente, depois das chamadas à frente do seu tempo e dos elogios de Jesus. «Tem sido uma grande aventura», assumiu recentemente. Muitos passos foram dados desde os nove anos, altura em que começou a jogar no clube. Luisão ainda recuou recentemente mais no tempo, puxando pela memória mais um par de anos, e recordou o momento em que entrou em campo na Luz ao lado de um miúdo que hoje se veste de vez em quando ao seu lado no balneário. Olhando para o seu potencial, a boa notícia é que a aventura parece muito longe de estar acabado. Estejam os deuses do futebol de acordo.
Golos e Assistências:
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