"O Futebol"
Comecemos por dois temas de fundo:
O que acha do apoio desta Direcção a Fernando Gomes para a Liga e Federação? Que justificação pode ter, olhando ao passado de Fernando Gomes e ao seu demonstrado envolvimento no Apito Dourado?
Acho que o apoio que o Benfica manifestou ao presidente da Federação foi uma decisão de convicção de Luís Filipe Vieira. O presidente acredita que Fernando Gomes pode ser um fator de mudança no futebol português. Eu não posso criticar o presidente do Benfica quando ele decide pela cabeça dele e decide em função do que acredita que é melhor para o Benfica. Eu critico-o é quando ele deixa que outros tomem as decisões por ele. E é bom não esquecer que Fernando Gomes não está sozinho na Federação, está acompanhado de Hermínio Loureiro, que era o presidente da Liga quando o Benfica foi campeão, pela última vez. E tem Humberto Coelho, sobre o qual não recai, nem deve recair a mínima suspeita.
E relativamente aos direitos televisivos? Joaquim Oliveira é mesmo o único caminho? Ou como defendemos no blog, a cisão completa (incluindo a saída deste da SAD e Multimédia) seria um passo decisivo na credibilização do futebol português?
Sobre a questão dos direitos televisivos a minha posição é muito clara. O Benfica deve ter uma posição negocial de força. O Benfica não deve fechar qualquer acordo por menos de 30 milhões de euros por época desportiva. Esta verba permitirá ao Benfica criar condições para estabilizar o seu projeto desportivo e as condições financeiras que o sustentem. Tenho informações que este valor não é irrealista e existem no mercado opções que podem eventualmente satisfazer este objetivo. Se é a Olivedesportos ou outro operador, francamente, para mim, é irrelevante. O que já não é irrelevante é que o Benfica tenha um contrato com a Olivedesportos, que garante a esta companhia o direito a igualar a melhor oferta.
A justiça obliterou o 'Apito Dourado', mas foram evidentes os sinais de promiscuidade na arbitragem beneficiando sempre o mesmo clube. Acha que faz sentido gastar enormes somas de dinheiro em contratações com as óbvias repercussões a nível financeiro, se não se garante que outros com alguns milhares (ou quinhentinhos) destruam todo esse trabalho?
Acho que faz sentido o Benfica apostar na competência. E a competência no futebol leva sempre aos melhores resultados. O Benfica, nos últimos anos, não tem ganho mais vezes porque se desleixou, porque apostou em pessoas que não acrescentaram valor ao clube e à SAD. Isto faz toda a diferença. Há três anos o Benfica apostou em qualidade, num bom treinador e não houve nenhum árbitro que conseguisse evitar aquilo a que se designou de “rolo compressor”. Além do mais, não é verdade que o nosso principal rival não faça o mesmo. O FC Porto também investe muito na sua equipa de futebol e isso é o que os torna mais fortes. No dia em que o Benfica se preocupar menos com o FC Porto e mais consigo próprio, estará mais perto de vencer. O FC Porto não é imbatível, mas criou no clube uma cultura de vitória.
O Benfica perdeu essa cultura, no Benfica deixou de haver exigência, passou a haver conformismo. Aquilo a que as pessoas chamam de sistema, existe há muito tempo e, de facto, durante tempo demais, mas foi o Benfica e as suas mais recentes direções que permitiram que o clube entrasse em auto - destruição. Por exemplo, Eriksson foi, durante cinco anos, treinador do Benfica. O sistema já existia e nessa altura com muito menos controlo mediático. No entanto, o Benfica venceu três campeonatos, duas taças de Portugal, uma das quais em pleno estádio das Antas, foi a duas finais europeias, venceu uma Taça Ibérica. Isto é o Benfica histórico, dominador e inigualável. O que temos hoje é uma caricatura desse Benfica e a culpa não é do sistema, é da propaganda que sistematicamente anestesia os benfiquistas, que já se habituaram a conviver com a derrota como se isso fizesse parte do nosso ADN. Não está, pelo menos, não devia estar. Eu não desconheço a existência do “sistema”, mas também não esqueço as nossas responsabilidades nas sucessivas vitórias do FC Porto. Eu só conheço um caminho para acabar com o “sistema”. É o Benfica ganhar no campo, e ganhar de forma repetida e não de cinco em cinco anos, quando existe uma mudança de ciclo no FC Porto.
A SAD do SLBenfica, como disse em tempos o Presidente, teria um responsável para o futebol: Rui Costa. Apesar de todas as tentativas de justificação, Rui Costa não faz parte da face visível da SAD apesar do cargo que o Presidente lhe anunciou. Que leitura faz desta situação?
O que penso sobre o papel que cabe ao Rui Costa é muito simples. Se, realmente, está condicionado, como parece, na sua intervenção, deve demitir-se e explicar porque o faz. Eu fi-lo, por isso, estou à vontade para o dizer. Ainda assim, é preciso perceber porque é que Rui Costa desapareceu de cena. Mas quem deve responder a isso é o presidente do Benfica. Foi ele que o contratou como diretor desportivo e foi ele que, aparentemente, o afastou do circuito. Este é um processo que devia ser melhor explicado aos benfiquistas.
Na sua perspetiva, já existe no futebol do SLBenfica uma estrutura capaz de "blindar" os treinadores e os jogadores, colocando fim ao conhecido "cemitério de treinadores e jogadores"? Já atuamos com capacidade de antecipação? em caso negativo, porque acha que não acontece?
O mais curioso é que a estrutura continua a engordar mas continua a falhar no essencial. Sobretudo na antecipação dos problemas. As pessoas entram e saem e a partir de uma certa altura parece que as pessoas se atropelam umas às outras. Não há uma orientação. Acho que a estrutura não precisa de tantas pessoas, ou melhor, se calhar precisa é de pessoas mais qualificadas. Por exemplo, porque é que o diretor da Academia é um antigo empresário FIFA? Isto é transparente no Benfica? Porque é que o Benfica não ataca o problema da formação de uma outra forma? Todos sabem que a França é o país com a melhor formação do Mundo. Porque é que o Benfica não investe na contratação de um formador em França, para formar os nossos formadores, durante três anos? Porque é que se continuam a contratar pessoas que aparentemente não têm capacidade para exercer determinadas funções? O que se passa na formação é gritante. O Benfica é o clube com mais internacionais, atualmente, no conjunto dos vários escalões etários, mas isto não significa que se esteja a trabalhar bem na formação. Estão a trabalhar bem na deteção, mas a formação é muito mais do que detetar talentos. É sobretudo criar condições para que esse talento seja canalizado para a equipa principal, mais tarde ou mais cedo. E isso continua a não acontecer.
O que falta, na sua perspectiva, ao SLBenfica para por fim à hegemonia (corrupta ou não, existe) do FCPorto? Que mudanças defende na estrutura do futebol do Benfica?
Falta recuperar uma cultura de vitória e estendê-la a todas as pessoas que diariamente trabalham no Benfica e pensam o Benfica. Desde logo, mudar as pessoas que não executam em função do Benfica mas sim em função do seu “tacho”. É preciso acabar com este “tachismo” no Benfica. É necessário criar novas competências na SAD, trazer pessoas que pensem mais no Benfica do que nelas próprias e sobretudo que possam enfrentar os desafios desportivos com uma lógica de vitória. O adversário não é imbatível, está longe de ser imbatível, mas uma das suas forças é exatamente esta, a de não permitir que em cargos executivos, esteja alguém que não se identifique com o clube e com a sua sede de vencer. E sobretudo que não se identifique com a cultura vigente no clube de ódio ao Benfica. Este é o adversário, esta é a sua cultura e isto apenas se combate com mais benfiquismo na SAD, com pessoas que tenham coragem para ir à luta e sobretudo tenham vontade de ir à luta, porque não é mais possível tolerar este estado de coisas, em que o Benfica é enxovalhado, achincalhado pelo nosso adversário sem uma resposta à altura dos nossos valores e da nossa história. Mas, para isso acontecer, é preciso conhecer os nossos valores e a nossa história. E há muita gente na SAD que não conhecem e por isso não estão disponíveis para travar esta luta em nome do Benfica.
"O Futuro"
Já disse que não é candidato às eleições, também já disse que apoiaria Bagão Félix, que por sua vez já disse que não avança. Há pouco tempo vimos as eleições do rival Sporting bastante concorridas, com ampla discussão do projeto desportivo e empresarial. O que impede de acontecer o mesmo no SLBenfica, com gente a aparecer com projetos e a querer discutir o SLBenfica?
Em primeiro lugar o Sporting não é exemplo. Um clube que cooptou um presidente em vez de o eleger não pode ser comparado com o Benfica, o clube com uma história de democracia interna que antecede a própria democracia no país. E convém recordar que nas últimas eleições do Sporting, apareceram muitos candidatos porque se criou uma situação de vazio de poder, com a demissão do presidente cessante. Se isso se verificasse no Benfica, creio que teríamos também uma pulverização de candidatos. Mas é verdade, também, que, hoje em dia, no Benfica se criou um ambiente de quase perseguição aos benfiquistas que não concordam com a atual direção. O que está a tornar-se perigoso, porque ameaça dividir o Benfica. Há uma coisa que já nem a atual propaganda vigente no clube consegue esconder, que é o crescente afastamento de milhares de benfiquistas que não deixaram de se rever no atual Benfica. O que vamos fazer com todas essas pessoas? Vamos atacá-las, vamos afastá-las ainda mais do Benfica? Vamos criar um novo Benfica, só para os benfiquistas que apoiam Vieira? É que a força que resta ao Benfica, como elemento de grandeza e de diferenciação é a sua base social de apoio. Se isso se perder, o Benfica corre riscos. É que há uma coisa que certas pessoas que rodeiam o presidente do Benfica ainda não perceberam, é que os adeptos e sócios que estão fora do controlo da propaganda é cada vez maior. E isto não se combate chamando-lhes abutres, isto combate-se dando-lhes vitórias no campo. É isto que Vieira tem de perceber rapidamente, sob pena de sair do Benfica pela porta pequena, o que até eu reconheço seria uma injustiça, para quem, apesar de tudo, já fez tanta coisa boa no clube, especialmente no primeiro mandato, quando esteve rodeado de melhor gente.
Já aqui defendemos uma solução de unidade que passaria por uma Direcção de união, capaz de congregar a continuidade Luis Filipe Vieira e alguns vice presidentes como Rui Gomes da Silva ou Rui Cunha, mas também trazer de volta ao SLBenfica outros como Cunha Leal, Fernando Tavares, Gaspar Ramos, Fernando Seara, Bagão Félix, José Eduardo Moniz, enfim... Acha isto possível? Porquê?
A unidade, assim descrita, é possível e até desejável embora não seja absolutamente essencial porque o Benfica não é um cube em reconstrução. Mas isso depende também do atual presidente, ser sensível às preocupações de pessoas que se cansaram de ver o Benfica entregue a um conformismo e a uma cultura de derrota que é incompatível com a grandeza do clube. O atual momento do Benfica dispensa grandes convulsões e se as pessoas, de um lado e do outro, estiverem disponíveis para colocar o Benfica acima dos seus interesses pessoais, então creio que se pode constituir uma boa solução. Até porque o atual presidente já demonstrou, no seu primeiro mandato, que quando está bem rodeado, consegue apresentar melhores resultados.
Considera que as eleições deveriam ser em Outubro, com 1/5 da época já decorrido, ou deveriam ser antecipadas para o período da pré-temporada?
Acho que não se trata de uma discussão essencial. O Benfica não está parado por causa das eleições. Tem um treinador, tem um plantel, tem uma direção e francamente essa discussão é irrelevante comparado com a importância dos temas que interessa discutir sobre o futuro do clube.
Um projeto capaz de colocar como prioridade a conquista de títulos deve prevalecer sobre as recentes abordagens de exploração da marca Benfica (à margem dos títulos), tal como a aplicação do numero de sócios, construção de infra - estruturas, etc?
O Benfica é um clube desportivo não é uma empresa. Isto não quer dizer que não existe uma estratégia de marca. Claro que sim, mas tem de estar subordinada a uma estratégia de produto. Primeiro os resultados, depois sim, a exploração da marca. O descontentamento generalizado dos adeptos provam isto, ninguém quer saber se o Benfica vendeu muitas camisolas ou fez grandes receitas. O que move os benfiquistas é saber se o Benfica ganha muitos, poucos ou nenhuns títulos. Atualmente a estratégia de marca está a sufocar o produto. Foi a estratégia de marca que fez com que o Benfica se distraísse do seu principal objetivo, que era ganhar o campeonato. Todos nós ficamos satisfeitos por ver o Benfica chegar aos quartos-de-final da Liga dos Campeões mas quem decide tem de ter a lucidez de perceber que o grande objetivo é ganhar o campeonato. Uma, duas, três vezes. E só depois de recuperar a hegemonia do futebol português se pode pensar em ganhar algo na Europa.
O que considera que seria um projeto ganhador para o SLBenfica? Estaria disposto a integra-lo? Em caso afirmativo que área considera que poderia ser uma mais-valia?
Um projeto ganhador seria um projeto que devolvesse o Benfica às vitórias e recuperasse a hegemonia do desporto nacional. Estou sempre disponível para ajudar o Benfica. A questão é saber se o presidente quer ser ajudado. A outra questão diz respeito aos sócios do Benfica. Há uma coisa que, para mim, é essencial. Se um dia voltar ao Benfica quero fazê-lo porque sou eleito, não quero escapar ao escrutínio dos sócios. Quero que os sócios tenham sempre na mão a capacidade para decidir a minha entrada e, mais importante, possam também decidir a minha saída. Porque isto é que é o Benfica e, hoje em dia, há gente que tem uma agenda escondida de poder no clube que está sempre a escapar ao escrutínio dos sócios do clube. Também é verdade que não podiam candidatar-se, porque se tratam de benfiquistas de aviário, que aprenderam a gostar do Benfica pela relação que o clube mantém com as suas contas bancárias. Eu não quero isto para mim. Eu quero servir o Benfica, não pretendo servir-me do Benfica. E uma mudança no clube tem de começar por aqui, por esta limpeza interna.
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