Eusébio não oficial

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Tuesday, January 7, 2014

Eusébio não oficial



Portugal, 7 de Janeiro de 2014

Por razões várias também relacionadas com a quadra Natalícia (mas não só), não tenho podido escrever como gostaria. A última coisa que podia imaginar é que o primeiro texto do ano seria dedicado ao desaparecimento de Eusébio, melhor jogador de todos os tempos, do Benfica e possivelmente de Portugal, e figura central do misticismo benfiquista.
Eusébio ficará para sempre ligado à história do Benfica.
Como jogador, Eusébio tocava a bola com a mesma simplicidade da educação e cultura africana que o moldou como ser humano. Se a bola se quer na baliza, Eusébio metia a bola na baliza. Ora metia a bola na baliza com potentes e colocados remates, ora metia a bola na baliza com subtis desvios de cabeça, ora metia a bola na baliza depois de correr (qual gazela do mato) e fintar um sem número de adversários...
Era um tempo em que o futebol era puro, genuíno, não havia tempo para os pormenores “fantásticos”, passes “açucarados”, simulações e outras “engenharias” do futebol actual. Era tudo simples e Eusébio era o Rei, porque era mesmo o melhor...
A cereja no topo do bolo veio no Mundial de 1966 e na final em Wembley contra o Manchester United em 1968. A mediatização dos dois eventos numa das nações mais industrializadas do mundo, somada à excelência e golos do futebol de Eusébio, criaram a figura do Rei e alcandoraram o Benfica à galeria do restrito número de clubes míticos.
Por questão de idades, só tive oportunidade de ver Eusébio jogar ao vivo uma vez. Já depois de ter sido descartado do Benfica, e andar por aí a vender as sobras do seu talento, como um vulgar saltimbanco ou artista de circo, ele jogou pela equipa cá da terra num jogo amigável contra o Sporting de Lamego. Talvez em 1977 ou 78, talvez na semana da romaria principal da cidade (na altura vila). O estádio estava abarrotar, a festa foi bonita e Eusébio recebeu o merecido carinho das gentes desta terra e do próprio adversário, rendidos a tamanha personalidade futebolística.
A dada altura houve um livre contra os de Lamego e o nosso capitão foi chamar Eusébio para marcar. Eusébio educadamente recusou, apontando para ele. Mas o nosso capitão fazia questão que fosse Eusébio a marcar. E Eusébio lá foi marcar. Remate e golo! Explosão de alegria entre as minhas gentes... que momento...
Quis o destino e a ingratidão característica de tantos períodos da história do Benfica, que Eusébio terminasse a carreira fora do clube do coração. Já não “rendia”, as lesões sucediam-se, já não servia. E lá foi empurrado borda fora com direito à costumeira e hipócrita festa de despedida. Sinais dos tempos: o Presidente que avalizou esse “vai-te embora”, Borges Coutinho, foi e é considerado um grande presidente em tudo que é enciclopédia sobre a história do Benfica....
Quis também o destino e a euforia dos anos de glória, que Eusébio fosse na vida particular o contraste do seu exemplo de futebolista. Como futebolista era o maior ídolo do clube e uma referência da Nação. Como cidadão e longe dos holofotes do público geral, os excessos, com mulheres e bebidas numa primeira fase, com uma vida desregrada nesta última fase, retorceram-lhe esse brilho e roubaram-lhe anos de vida que tanta falta agora lhe (nos) faziam....
Como referi, Eusébio ficará para sempre ligado à história do Clube. Em primeiro lugar porque nos escolheu para jogar e alcançar a glória como futebolista, tornando-se único e tornando-nos míticos. Em segundo lugar porque com o abraço a Vilarinho decidiu as eleições de 2000 que conduziram o Benfica a isto que hoje vamos vendo, para o bem e para o mal.
Esta última decisão marcou uma vez mais a relação de Eusébio com o Clube e o Futuro. Uns dirão, que bem. Outros, nos quais me incluo, dirão, que mal! Eusébio deveria ter-se mantido equidistante das candidaturas, respeitando a união e liberdade de escolha dos sócios do Benfica. Eusébio deveria ter percebido que o seu lugar na História do Benfica podia ultrapassar a do Melhor jogador de sempre e ser também a Grande referência, a seguir a Cosme Damião.
Ao optar por uma das candidaturas, Eusébio tomou partido de uns elementos da família, sobre outros. Dividiu e desuniu. Vulgarizou-se. Deixou de ser uma referência do futebol e passou a ser um actor de política. Jogou num plano que não era o que o tinha distinguido. Ganhou na política, mas perdeu a admiração de muitos.
Não surpreende que na altura se constasse que esse apoio “corajoso” significou um aumento salarial de 1700 contos para 5000 contos por mês. Mais tarde Eusébio zangou-se publicamente com a mesma “tropa” que chorou “baba e ranho” no seu funeral, e que lhe baixara o salário por causa dos impostos. Nada que surpreenda. Quem se vulgariza acaba vulgarizado. Panteão? Sim! Nome do Estádio? Claramente não! Imagem nas camisolas? Não! Já temos um emblema!
Eusébio jogou como sabia, viveu como podia. Duas faces da mesma moeda, uma moeda mais cara que coroa.

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