Portugal, 30 de Novembro de 2013
O tempo passa depressa e os afazeres profissionais impediram-me de escrever umas linhas a propósito da fantástica primeira vitória em casa do Anderlecht, nosso carrasco na única final da Taça UEFA que disputamos ao longo de todo o nosso historial.
Para os “canucos” que na década de 80 ainda brincavam ao pião e ao berlinde, é natural que esta vitória seja sentida como apenas mais uma. Para os que como eu, nessa década já tinham plena consciência desportiva, é uma vitória especial, 30 e tal anos atrasada, mas que ainda veio a tempo para quem não esqueceu a derrota nessa Taça UEFA de 1982.
Na altura, primeira metade da década de 80, o Anderlecht era uma equipa de grande dimensão europeia, ligeiramente atrás de Real Madrid, Bayern, AC Milan, Liverpool (na época a melhor equipa inglesa) e Juventus. Mas acima de outras como por exemplo o Barcelona.
As eliminatórias com equipas portuguesas tinham o FCP como maior vítima, sempre eliminado com alguma facilidade. Numa das visitas à Bélgica foram goleados por 4-0. O Benfica apenas teve um cruzamento nessa fatídica final a duas mãos em 1982, em que Diamantino falhou um golo de baliza aberta, na Bélgica (derrota por 1-0), e depois cá, Lozano (depois contratado pelo Real Madrid) empatou o jogo (o golo de Shéu empatara a final), obrigando o Benfica a ter de marcar mais dois golos para vencer a Taça. O que não sucedeu.
Essa derrota foi difícil de encaixar (mais do que a recente derrota com o Chelsea), porque tínhamos feito um excelente percurso até à final, sem derrotas, com Filipovic como maior goleador da prova, e porque eu achava que o Benfica era melhor e merecia ganhar. Adiante.
Infelizmente hoje, e ao contrário de há 30 anos atrás, o grau de exigência dos adeptos é maior, a cultura futebolística está desvirtuada por acenos de perfeição ao virar da esquina, vindos da bancada dos jornalistas (alguns pançudos), analistas e outros auto proclamados entendidos de futebol, que mais não são do que peões de influência, num jogo que é de outros. De quem lhes paga e quer que as coisa sejam assim.
Fiquei pois algo perplexo por umas quantas criticas que li e ouvi ao jogo do Benfica, assim como com os 56% de votos no CM de adeptos que não gostaram da exibição do Benfica. Mas no CM temos de compreender, porque o público leitor é de tendência sportinguista e não gostam nada destas vitórias do Benfica.
Já na Benfica TV captei uma parte do debate em que estavam Calado, Mantorras, Rogério Matias, Pedro Ferreira e o Hélder Conduto como condutor do programa. A dado passo, Calado exprimiu uns quantos comentários à forma de jogar do Benfica, em particular após termos conseguido dar a volta ao resultado, sendo que segundo ele, “o Benfica não controlou bem o jogo depois disso, não foi coeso a defender a vantagem, não foi organizado a explorar o contra ataque” etc, etc. No que foi corroborado pelo Matias.
Tenho muita simpatia pelo Calado. Já o ouvi falar algumas vezes e reconheço-lhe conhecimento de causa. Fala do que acontece, fala de aspectos técnicos, fala com proactividade na busca do conhecimento resultante do jogo que foi observado. Contudo desta vez, não posso estar mais em desacordo com ele. Porque quando se ganha um jogo, não se comenta como é que se podia ter evitado um golo ou como se podia ter marcado mais um golo. Isso faz-se quando não se ganha. Quando se ganha e em particular quando se ganha onde nunca se havia ganho, não há como reter a importâncias desse facto e sublinhá-lo, porque, seguramente, nos próximos anos não vai voltar a acontecer.
Até porque quando estava a ouvir Calado falar dos “metros que Enzo tinha que correr sem que tivesse ninguém à sua frente”, dei por mim a pensar “mas Calado, tu foste titular na derrota por 7-0 em Vigo. O que é que falhou nessa altura e porque não viste logo isso dentro do campo?”.
Teve de ser o Hélder Conduto a salvar o tema quando constatou “mas na Grécia o Benfica fez um jogo mais organizado, mais equilibrado, teve várias situações de golo e perdeu”. Foi o clique necessário para todos se rirem e constatarem que é bem melhor jogar mal e ganhar, do que jogar bem e perder. Assim já nos entendemos.
Não penso que o Anderlecht tenha sido um chocolate doce e fácil de trincar. Longe disso. Ao contrário do RECORD que salientou a diferença de qualidade e meios das duas equipas (aspecto que não lhes ocorreu quando perdemos 3-0 com o PSG), o Anderlcht teve momentos que mostrou ser uma equipa compacta, culta tácticamente, esperando o erro do Benfica, mas teve pela frente um Benfica de fé, crença, raça e ambição. Pode não parecer aos simplistas que só gostam de jogar a bola no meio campo do adversário, mas este Benfica está a jogar muito. E não é o erro táctico aqui com os gregos que altera isto.
O minuto 90 desta vez não foi destacado, pelos mesmos que o fazem quando a situação é ao contrário. Mas foram dois minutos 90: o do nosso golo da vitória, e o do golo da derrota dos gregos em Paris. Pode ser premonitório...
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