Exmo. Sr. Presidente do Sport Lisboa e Benfica e da SAD,
Exmo. Consócio e Águia de Ouro Luís Filipe Vieira,
Assunto: Resposta à união pedida entre os benfiquistas
Os benfiquistas pediram. E a promessa foi cumprida. Os bilhetes de sócio para a partida de ontem, frente a um histórico rival da cidade de Lisboa, chegaram a custar 9 Euros. Quando cheguei ao interior do estádio qual não foi a surpresa ao ver as bancadas despidas. Desta feita, tão pobre era a casa que nem foi anunciada a lotação, como acontece habitualmente no início da segunda parte e constitui-se sempre como um momento em que os benfiquistas presentes têm a oportunidade de se aplaudir entre si pelo esforço depositado em mais uma presença no seu templo.
Com toda a sinceridade, espero estar errado. Já o escrevi na 3ª jornada e, infelizmente, mantenho a opinião. À semelhança do campeonato espanhol, numa competição tão pouco competitiva como a liga nacional, disputada essencialmente por duas equipas, 5 pontos de desvantagem não são fáceis de recuperar. Acresce ainda que seria aconselhável recuperar pelos menos 9 pontos até à penúltima jornada, dada a deslocação ao estádio do Dragão no último jogo. Ademais, para se ser campeão em Portugal existe uma necessidade imperiosa de 100 % de vitórias nos jogos em casa, o que já se ia tornando praticamente impossível frente ao Gil Vicente e se confirmou ontem com os azuis de Belém.
É certo que não existem campeonatos iguais. No entanto, lembrando a falta que os 6 pontos perdidos em casa com Braga, Porto e Estoril na época passada, estes 2 pontos (mais aqueles já perdidos na Madeira e em Alvalade, que não se verificaram na época passada) farão muita falta até ao final.
Serão estas contas de prova real na cabeça dos benfiquistas que os têm afastado do seu querido estádio? Embora a crise, a chuva torrencial e o aumento do número de assinantes que podem ver o jogo na Benfica TV tenham sido certamente fatores de contribuição, é importante não esquecer que o primeiro jogo da Liga dos Campeões, frente ao Anderlecht em casa, também registou uma fraca moldura humana.
O que será que se passa? A verdade é que no Benfica cada vez há mais sócios e cada vez há menores assistências. No Benfica as assembleias gerais já são novamente às sextas feiras e há menos militância. No Benfica cada vez há mais vendas de camisolas e menos crença.
Deambulo pela internet e por outros meios sociais onde pairam benfiquistas e, em cada frase, em cada página, em cada comentário, lá estão os parágrafos da moda: “Isto não é o MEU Benfica...”, “COSME DAMIÃO teria vergonha...” e o “Benfica deixou de GANHAR e morreu a partir de 1994”.
De facto, o nosso clube abriu o seu museu ainda este ano. Porém, ao ler estas frases penso que sua a história permanece por contar. Em primeiro lugar, o Benfica não é de ninguém. Bem sei que o termo o “MEU Benfica” não tem esse intuito de auto-empoderamento e pretende significar “isto não foi o que aprendi a gostar” e “estes não são os valores que aprendi a cultivar”. A história do Benfica está contada sob a forma de lenda (e que bonita que ela é!), mas talvez não fizesse mal conhecer-se os textos de Paulino Gomes Júnior sobre “abutres”, ter conhecimento de alguns amuos e certos autoritarismos dos dirigentes mais conceituados e fazer uma análise do comportamento dos associados nas assembleias gerais, dos processos eleitorais e sistemas de votação do clube ao longo do século.
COSME DAMIÃO foi, sem dúvida, aquele que melhor personificou o que é a mística benfiquista. Escandalizam-me a utilização de expressões populistas invocando o seu nome. Entender que a concepção que Cosme Damião deu ao Benfica nos seus primeiros anos de vida foi tão importante, para o futuro do clube, como o momento da sua saída, torna-se fundamental para se evitarem discursos que não são maduros, preparados e que não deveriam usar, à viva voz, espíritos benfiquistas em vão, sem conhecer a sua verdadeira história.
Terminando pelo GANHAR até 1994, as notícias da “morte são manifestamente exageradas”, como escreveu Mark Twain.Importa lembrar que o Sport Lisboa e Benfica nas duas últimas vezes que disputou finais europeias, em 1988 e 1990, não conquistou esses dois campeonatos nacionais, nem sequer as duas Taças de Portugal, ficando, respectivamente a 15 e a 4 pontos do FC Porto, deixando também as taças ser conquistadas pelo mesmo clube e pelo Estrela da Amadora.
O Sr. Presidente pede, mais do que nunca, a união entre os benfiquistas. Todos quanto me conhecem sabem o quanto fui aqui uma voz crítica de algum do seu trabalho nos últimos mandatos e, sobretudo, do seu estilo. Mas desta vez acho mesmo que tem razão. Infelizmente, mais na forma do que no conteúdo.
Os benfiquistas precisam de se unir, é verdade. Mas não é em torno de estar bem posicionado no Top 10 do rankingeuropeu. Os benfiquistas, sobretudo os mais jovens, precisam de se unir mais do que nunca no sentido de aliviarem a pressão da quimera que conceptualizaram como Benfiquismo, sob pena de nunca se reverem em algo que não existe, de tão perfeito que imaginam.
Os benfiquistas precisam de se unir, sim. Mas não é à procura da vitória na Liga dos Campeões, envaidecendo-os deste ano ser jogada em Lisboa.
Os benfiquistas precisam de se unir em torno do escudo de campeão nacional e ser a conquista desse ceptro a sua principal prioridade. Os benfiquistas precisam de se unir, concordo. Mas não é à volta do “melhor plantel dos últimos 30 anos”. Os benfiquistas precisam de se unir à volta de um clube com identidade, deferência institucional e que seja um baluarte na defesa dos interesses do desporto em Portugal.
Os benfiquistas precisam de se unir, nada mais importante. Mas não é através do endividamento, na esperança de continuar a gerar mais e mais receitas. Os benfiquistas precisam de se unir através de uma gestão coesa, responsável e responsabilizante da sociedade.
Os benfiquistas precisam de se unir, já! Mas não é com ofensas e a criação de um clima de guerrilha entre os adeptos que pensam de maneira diferente. É com ensinamento e associativismo.
Os benfiquistas precisam de se unir, tem toda a razão. Mas não é com desculpas. É com boas práticas e competência.
O que o treinador do Belenenses ordenou ontem os seus jogadores fazerem nos últimos minutos no estádio da Luz era aquilo que Jorge Jesus deveria ter feito no Porto no final da época passada, em vez de permitir que André Almeida fizesse o lançamento de linha lateral para Cardozo no meio da grande área, encurralado por 4 defesas, e permitindo um contra ataque onde Roderick não soube fazer falta (Enzo Perez tinha sido encostado à direita) e ainda hoje ninguém sabe onde andava Maxi.
Não acho justo, nem tenho crucificado ninguém por termos perdido daquela forma inglória depois de uma época que parecia destinada. Mas não aceito que tenha sido só azar!
O mesmo se pode dizer em relação à final da Liga Europa. As finais não são ganhas, na maior parte dos casos, por quem mais se entrega ao jogo e “joga melhor à bola” (e que elogio merece o Benfica a esse respeito!), mas sim por quem joga com alguma “ratice” e sabe fazer as leituras certas nos momentos cruciais. Infelizmente, desde 1962, em que Béla Guttmann se apercebeu do cansaço físico dos jogadores do Real Madrid ao intervalo, que o Benfica tem sido sempre um pouco amador e inexperiente nas finais que disputa. Continua a ser necessário jogar mais com a “cabeça” e não tanto com a “língua de fora” nos jogos decisivos e nas finais. É só isso que a maldição significa. Não uma macumba de azar.
Com este tipo de conteúdo e com uma verdadeira aprendizagem sobre os erros cometidos – algo que prometeu –, da minha parte poderá contar com a união que, de forma modesta, ao longo da minha jovem vida sempre fui dando e que, de forma indissociável daquilo que sou, tudo farei para continuar a dar: pagar todos os meses as quotas de associado e continuar a frequentar o estádio com a voz levantada e o cachecol nos braços.
E Pluribus Unum é uma frase demasiado forte para ser desprezada.
Subscrevo-me atentamente e com as mais cordiais saudações benfiquistas,
Fernando Arrobas da Silva
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