É pois com agrado que noto a mudança de opinião de algumas pessoas em relação àquilo que tem sido o trabalho de Jorge Jesus no Benfica. Uma certa ânsia de que o homem desaparecesse da Luz o mais rápido possível tem dado lugar a um quase desespero de que o Benfica não cometa um dos maiores erros da sua história recente, que seria deitar abaixo tudo aquilo que de bom tem sido construído, para voltar a dar lugar à incerteza, à abertura de melões, à espera que um deles nos traga o sumo de que precisamos para nos alimentar o ego enquanto clube, leia-se “vitórias”.
Não há claro mal nenhum em mudar-se de opinião. O meu problema é questionar se não estaremos aqui a desviar-nos do essencial. A que se deve essa súbita mudança de opinião? Será Jorge Jesus melhor treinador hoje do que era há três meses atrás? O modelo de jogo mudou? A equipa que marcava 3 golos por jogo passou a marcar 4? O treinador deixou de ser vaidoso e de reclamar méritos excessivos no seu trabalho? Deixou de ser saloio e inculto desde que começou a recitar Pascal? Deixou de ser teimoso? Deixou de dizer aquilo que pensa e passou a falar português correto?
Não. A resposta é que nada disso mudou, o que me leva a crer que aqui o possível erro de análise é que a mudança da opinião de algumas pessoas (que diga-se, não é só neste blogue mas também nas televisões e nos jornais), se deve apenas aos... resultados desportivos do momento presente.
O perigo aqui é que quando se muda de opinião por causa dos resultados do momento presente, facilmente se mudará de novo se os resultados em 2 ou 3 jogos do momento futuro não forem aquilo que vaticinamos. A opinião mudará se daqui a mês e meio, tivermos se calhar para celebrar apenas uma Taça de Portugal ou quiçá Porra Nenhuma. Aí voltaremos pois então à depressão e às lamúrias, e à absoluta certeza de que a solução para os nossos problemas estará, claro... na substituição do treinador.
Eu tenho sido um acérrimo defensor do trabalho de Jorge Jesus, não é porque tenha ganho carradas de títulos nos últimos 3 anos. Eu gosto de Jorge Jesus porque vejo o Benfica a jogar bem, vejo o Benfica a ganhar muitos jogos e a marcar muitos golos, vejo alegria ao longo da época, vejo um modelo de jogo, vejo jogadores que sabem o que fazem dentro do campo, vejo jogadores motivados e que morrem em campo, vejo jogadores que evoluem técnica e taticamente, vejo ativos valorizados, vejo uma equipa disciplinada e sem vacas sagradas, vejo sobretudo evolução em relação à anarquia e ao regabofe que foi muito da história do Benfica nos últimos anos.
Alguns poderão dizer, “Sim mas, e os resultados?” E esse é para mim o erro. Porque eu, quando vejo os aspetos positivos acima referidos, tenho de acreditar que o caminho traçado é o correto e que os resultados surgirão mais cedo ou mais tarde. Os resultados não podem ser TUDO, essencialmente porque temos de aceitar que nestas coisas dos resultados desportivos, não basta contar com a competência do nosso trabalho mas também com a dos nossos adversários.
O Benfica chega pois a esta altura da época com 25 jogos disputados no campeonato e 21 vitórias. O número de vitórias de Jorge Jesus à frente do Benfica é impressionante. Em condições normais essa média seria suficiente para vencer muitos campeonatos. Mas também pode não ser suficiente se houver um adversário como foi o Porto de Vilas Boas que seja capaz de terminar a época sem derrotas. Ou não será suficiente se houver um clube capaz de garantir o titulo na penúltima jornada com um golo no último minuto 2 metros em fora de jogo.
Na próxima época poderemos pois ir contratar outro treinador, que em 25 jogos não ganha 21 mas apenas 17. Ainda assim, nesse ano a época também correu mal ao Porto, o James Rodriguez partiu uma perna, o Sporting faliu, e somos campeões. E esse novo treinador vira pois o herói do povo e exigir-se-á a imediata renovação do contrato, ainda assim um sucesso fugaz e passageiro, porque na época seguinte, já com um Porto mais fulgurante, percebemos que essas apenas 17 vitórias que um ano antes tantas alegrias nos deram, nos deixam desta vez arredados do título bem perto do Natal.
E este é pois para mim, o grande erro de se analisar o trabalho dos treinadores apenas pelos resultados desportivos. Seria o mesmo que analisar o trabalho dos guarda-redes pelo número de golos sofridos, ou o trabalho dos avançados pelo número de botas de ouro. É também o erro de muitos que desvalorizam os 345 golos de Ronaldo num ano, porque o Messi foi capaz de marcar 346!
A minha opinião é que no mundo do futebol não há muitos treinadores capazes de deixar marca. No Benfica, nos últimos anos, houve apenas um que para mim poderia ter deixado essa marca, assim lhe fosse dado o tempo que não teve: Fernando Santos.
Quando ouço nos dias de hoje certos treinadores ou ex-treinadores de futebol a fazer comentários de futebol na televisão, fico com a certeza de que muito poucos têm os conhecimentos técnico e táticos, capazes de implantar um modelo de jogo nas suas equipas, de tomarem em mãos um projeto a longo prazo. Alguns até tiveram algum sucesso, mas quase sempre mais fruto das circunstâncias e da sorte do que propriamente da sua competência.
Aliás, esta última moda de fazer de ex jogadores do Porto imediatamente treinadores de primeira divisão mostra uma clara tendência: a aposta em soluções rápidas e em terapias de choque. Aquilo que Costinha traz ao futebol, tal como Pedro Emanuel, Jorge Costa, Domingos, Sérgio Conceição ou Nuno, é apenas a sua personalidade forte, a irreverência e espírito de luta, que foram apanágio dos clubes em que se fizeram homens. É essa pois, a aposta de muitos presidentes nos dias de hoje, em detrimento dos modelos de jogo, dos automatismos, dos conhecimentos táticos. Quer-se pois soluções rápidas, chicotadas psicológicas capazes de aumentar rapidamente os índices de auto estima da equipa, que possa trazer vitórias já no jogo seguinte.
E muitas vezes trazem. O problema é que essas soluções não perduram no tempo, são soluções temporárias, porque quando a competência dos treinadores é apenas os estímulos psicológicos momentâneos, rapidamente percebemos que quando se entra numa espiral negativa de resultados e de animo, não há método nem conhecimento capaz de encontrar soluções que invertam o ciclo negativo em que se entrou.
Essa é pois para mim a grande diferença entre Jorge Jesus e a maioria dos outros treinadores de futebol: conhecimento. E eu acredito que quando há conhecimento e competência os resultados surgirão mais cedo ou mais tarde, de forma duradoura e não apenas fogachos no tempo, muitas vezes resultado da sorte ou do desnorte dos adversários.
Defender pois hoje a permanência de Jorge Jesus no Benfica quando há três meses atrás se defendia o contrário? Pois que se defenda, mas seria importante que essa mudança de posição fosse resultado de uma mudança com mais substancia do que apenas a bola que entrou ou não na baliza. É que no Domingo o Benfica até pode não derrotar o Sporting. O herói pode voltar a ser besta. Mas não passará a ser melhor nem pior treinador por causa disso.
إرسال تعليق