A estupidez
Não têm sido raras as vezes em que me perguntam porque tenho escrito pouco. Na maior parte dos casos, respondi que ando sem tempo, o que até é verdade, mas outros houve em que acrescentei uma opinião e um estado de espírito. É esse o tema deste texto.
Começou no dia, não sei exactamente quando, em que o espectro eleições pairou no ar. Se as discussões sobre o Benfica envolvem, normal e compreensivelmente, um elevado grau de fanatismo, foi a estupidez que passou a predominar. Desde então, toda e qualquer opinião é tida, por muitos benfiquistas, como sendo a favor ou contra o nosso presidente. Não há meio termo.
Um benfiquista como eu, que reconhece méritos e deméritos às presidências LFV, arrisca-se, na mesma conversa, a ser apelidado de seguidista e abutre ou de verdadeiro benfiquista e ingrato. Dá ideia que terminou o tempo em que o Sport Lisboa e Benfica era um clube que acolhia a pluralidade de opinião e convidava os seus sócios a manifestá-la. A opinião, isto é, a diferença de opinião entre benfiquistas e a sua manifestação, deixou de ser entendida como um sinal de vitalidade do clube. Ao invés disso, quem a emite, é imediatamente catalogado consoante as convicções da cada um. O passado recente conduziu a este fenómeno.
Desde logo, algo que demonstra que o SLB não é hoje, nem é há 20 / 25 anos, o clube que foi ao longo da maior parte da sua vida. Refiro-me concretamente à necessidade de individualizar na pessoa do presidente tudo o que de bom ou mau acontece no clube. Isto denota que haverá um fenómeno de tentativa de imitação face ao que se passa no nosso actual principal rival, o porto.
Internamente, contribuiu também para esta postura dos benfiquistas, o famigerado mandato do Vale e Azevedo. Muito justamente, tomou-se a consciência que uma só pessoa poderá ter a capacidade para destruir o clube. O corolário desta constatação, ainda para mais com o exemplo a norte, é que bastará igualmente apenas uma pessoa para o salvar.
E é neste contexto que surge o fenómeno LFV que, pelo mérito reconhecido de ter sido o principal protagonista de um processo de recuperação do Sport Lisboa e Benfica na última década, nele residem as causas e as consequências de toda e qualquer decisão tomada no seio do clube.
Mas a culpa não é somente dos sócios, também é do próprio Luís Filipe Vieira ao permitir, ou mesmo fomentar, que a comunicação do clube (desde o departamento de comunicação aos órgãos de comunicação), por vezes, mais pareça servir a presidência que o Sport Lisboa e Benfica.
Desde discursos do presidente em que apelida, por tudo e por nada, de abutres os que o criticam, até ao uso da expressão "detractores", sem explicar a quem se refere, na primeira página do jornal ou dos constantes agradecimentos dos funcionários (nunca é à direcção, é sempre ao presidente), à constante referência ao presidente na Benfica TV, vemos de tudo um pouco dando, dessa forma, alguma base de sustentação aos que afirmam que o LFV é o "grande líder" colando, assim, o actual SLB à Coreia do Norte.
Isto leva a que, como referi no início, tenhamos chegado a um ponto em que não há espaço para ponderação. Bem tento mas tornou-se cada vez mais complicado de participar em discussões sobre o Benfica. E posso dar alguns exemplos recentes:
- Contratação do Lima. O mundo benfiquista dividiu-se entre o contentamento pela contratação de um excelente avançado e a fúria por não se ter adquirido um defesa-esquerdo. De um lado ficaram os que acham que, com o Lima, Rodrigo e Cardozo, marcaremos 90 golos só à conta deles, do outro os que julgam que sofreremos 50 golos só pelo lado esquerdo. Raramente tive espaço para poder afirmar que gostaria que tivesse vindo um lateral-esquerdo e que a contratação do Lima foi excelente.
- Última assembleia. Votei a favor do relatório e contas porque considerei que merecia ser aprovado. Já tive que explicar variadíssimas vezes porquê. Especialmente após ter revelado que votarei em branco caso o LFV seja o único candidato nas próximas eleições. Esta posição seria tema para um outro post mas será assim tão incompreensível que se distinga o sentido de voto entre um relatório e contas e o contexto de uma determinado eleição?
- Ainda a última assembleia. Considero deplorável o que se passou na 5ª feira. Como votei a favor do relatório, logo vieram aqueles que encontraram aí a razão do meu descontentamento. Nada mais falso. O que ocorreu foi triste, desprestigiante no presente, preocupante para o futuro e sintomático da inexistência de clarividência e capacidade de pensar entre os benfiquistas.
- Por último, a assembleia novamente. Ontem à noite manifestei a minha indignação pelas declarações dos presidentes de duas (três) casas do Benfica. Limitei-me a perguntar se seria para "isto" que as casas do Benfica servem e a reproduzir as tais declarações. Julguei que fossem auto-explicativas. Mas esqueci-me que o Sport Lisboa e Benfica e os seus adeptos mudaram. Repare-se que, 24 horas depois de ter escrito que o comportamento de alguns sócios na assembleia fora lamentável, fui acusado de considerar que o que é bom são petardos em assembleias. Um dia depois de ser acusado de seguidismo por alguns, passei a ser um vândalo para outros. É o Benfica do presente.
Mas não é só o desnorte dos benfiquistas ou o eventual fomento desse desnorte pela direcção que conduzem a este estado de espírito. É também a chamada "oposição". Como é que o SLB chegou a um ponto em que, sendo mais que previsível a contestação que ocorreu na última assembleia, não exista uma "oposição" organizada a menos de um mês das eleições? Como é que se poderá acusar o presidente de contratar adeptos de outros clubes para posições chave no nosso clube se, entre as duas centenas de milhares de sócios que temos, não há quem sequer tome formalmente uma posição crítica? Depois queixam-se de serem os "malucos" das claques a fazerem barulho... É que eu, embora repudie a forma e, em parte, o conteúdo, tenho a consciência que o "barulho" na assembleia passa também por ser um pedido para que alguém se candidate. É muito mau sinal que haja quem se limite por aguardar por esse barulho para se candidatar...
E é por tudo isto que tenho escrito pouco: Não tenho tempo e ando farto de tanta estupidez.
Nota sobre o post anterior:
Conforme referi, julguei que as declarações dos presidentes das casas da Moita, Marinha Grande e Porto fossem auto-explicativas para a minha indignação. Convém explicar que as casas, bem como as filiais e delegações, advêm de uma ideia defendida e implementada desde muito cedo por Cosme Damião. O objectivo foi difundir o benfiquismo em zonas distantes de Lisboa.
Nos estatutos, refere-se o papel das casas:
As CASAS DO BENFICA têm como principal actividade a promoção de são convívio cultural, social e desportivo entre sócios e simpatizantes do Clube, obedecendo às directivas e determinações dos órgãos competentes do Clube.
As CASAS DO BENFICA têm como principal actividade a promoção de são convívio cultural, social e desportivo entre sócios e simpatizantes do Clube, obedecendo às directivas e determinações dos órgãos competentes do Clube.
Falar em arregimentação das casas do Benfica em torno do apoio a um presidente para combater "grupos organizados" de combate a esse presidente, é cumprir o papel das casas?
Apelidar de "verdadeiros benfiquistas" somente aqueles que apoiam um presidente é cumprir o papel das casas?
Não me parece e julgo que não é necessário explicar porquê.
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